Neste incesto
de terra e céu pousado nas casas
e o sol de suor
- que sei eu do resto
para além do musgo de asas ?
Vagos deuses de cores
numa herança de problemas
que ainda existem talvez
por parecerem nuvens com algemas.
Quando eu era criança
eu tinha um campo verde
muito verde,
um verde de esperança
que o tempo amareleceu.
maldito tempo
que passou indiferente
e nunca se compadeceu...
Hoje, esse campo
outrora fértil de ilusões,
não tem cor nem vida
tem apenas recordações...
perdeu a sua frescura
tornou-se céptico
e numa enorme pedra dura.
Quem me dera voltar a ser criança...
para de novo ter um campo verde,
muito verde... um verde de esperança
onde eu pudesse de novo construir castelos,
mas mais sólidos,
para não puderem ruir...
Mas o milagre
de voltar a ser criança
não surgirá,
eu sei. É assim a vida !...
E eu continuarei no mesmo campo
cada vez mais amarelecido pelo tempo
até ao dia em que ele secará
completamente, comigo .
Cala-te, voz que duvida
e me adormece
a dizer-me que a vida
nunca vale o sonho que se esquece.
Cala-te, voz que assevera
e insinua
que a primavera,
a pintar-se de lua
nos telhados,
só é bela
quando se inventa
de olhos fechados
nas noites de chuva e de tormenta.
Cala-te, sedução
desta voz que me diz
que as flores são imaginação
sem raiz.
Cala-te, voz maldita
que me grita
que o sol, a luz e o vento
são apenas o meu pensamento
enlouquecido ...
(E sem a minha sombra
o chão tem lá sentido!)
Dia de horizontes com dez metros
e este azul do céu opaco
que toco com as mãos ...
Dia de alegria sem os limites
em que ninguém nasceu esta manhã.
Nem os perfumes fugiram das flores ...
Nem as lágrimas cairam olhos líquidos...
Nem os voos quiseram ser canções...
E o próprio vento
parou de súbito no Ar
com saudades dum corpo...
(Dia em que não posso mais
e vou saltar o Muro.)
No mar tanta tormenta e tanto dano,
Tantas vezes a morte foi aparecida ;
Na terra tanta guerra, tanto engano,
Tanta necessidade, coisa aborrecida!
Onde pode acolher-se um fraco humano,
Onde estará segura a sua curta vida ,
Que não se arme e indigne o Céu sereno
Contra um bicho da terra tão pequeno ?
És uma chama de ternura,
Uma brisa carregada de pétalas,
Um luaceiro de estrelas
Numa noite de Estio .
És o sopro de Deus
Que faz florir os mundos
E traz em si o gérmen
De todas as promessas criadoras.
Tens a virtude oculta que redime;
Podes moldar a vida à tua imagem
Bendita a hora em que poisaste
Os olhos sobre mim !
No rasto desse olhar,
Reflexo sobre o tempo,
Regresso ao caos vivo e originário,
E, entre o não ser e o ser,
Pairo sobre os abismos constelados
Como um clarão crepuscular :
Sou êxtase,
Espírito,
Luar ...