26 março 2010

Luz.

Ao pé do mar
os corpos nus
têm a leveza
de certa luz
por inventar.

Luz quase canto
de aves sem penas
que cobre os seios
de ouro solar,
chamem-lhe manto.

Corpos apenas
puros e feios
sem a vileza
das nossas almas
que pesam tanto.

19 março 2010

O princípio.

Choveu de madrugada...
E agora as raízes mergulham mais na terra
as bocas que comem.

Que bom! Cheira a terra molhada.
Cheira à criação do primeiro homem.

Eh! velhos pinheiros!
Cá estou outra vez
a falar com vocês
numa língua estranha
que não é português
nem espanhol ...
Mas esta alegria do princípio do mundo
de andar com as mãos roubadas a um vagabundo
a atirar pedras aos pássaros e ao sol.

15 março 2010

Fantasmas.


Para que me serve agora essa esperança
e o passado tal como o penso
visto pelos olhos arrancados
aos meus fantasmas de criança
que trago atados num lenço
e que de quando em quando desembrulho
com a sensação de viver sofucado de silêncio
debaixo de entulho ?

10 março 2010

Poemas II.


Oh cese ya, Señor, Tú dura mano!
No llegues tanto al cabo con mi vida;
Baste el estar por Ti tan consumida,
Que ya no se halla en ella  lugar sano.

Ay estraña hermosura! ay deshumano
Hado, á que nunca puedo hallar salida!
Si Tú de Tú  piedad no eres movida,
Roto el hilo vital verás temprano .

Un blando desamor, un amor blando,
Bien hasta para un hombre tan perdido,
Que de su mal ningún remedio espera.

Y se estimas en poco el ver cual ando,
Aquí me tienes ante Ti rendido;
Viva tu gusto, mi esperanza muera.


~~~~~~~~~~~~ooooo~~~~~~~~~~ (a)

Dulces engaños de mis ojos tristes,
Cuan vivo despertais mi pensamiento!
Aquello que pudiera dar contento,
En sombra de pintura lo volvistes.

De blando sobresalto enternecistes
Con vista arrebatada el sentimiento;
Mas no le asegurastes un momento
Aqueste vano bien que le ofrecistes.

Veo que la figura era fingida,
Y no aquella que en sí mi alma sconde,
Aunque en esto se llega al natural:

Así escuta mi llanto, así responde,
Así me condolece de mi vida,
Como se fuera el propio original.

(a) Poemas de Camões.

09 março 2010

Sonetos.

Mi gusto y tú beldad se deposaron,
Terceros por mí mal mis ojos fueron;
Su logro ha sido tal, que, alfin, hicieron
Un hijo hermoso á quien amor llamaron.

Tan fuera de compás le regalaron,
Que cuando más alegres estuvieron,
Sin entender el mal que produjeron,
Perdidos por amores se miraron.

La beldad desposada deste duelo,
Vino á parir un monstro con dos alas;
La madre es la soberbia, el niño el zelo.

Oh! madre que á tu hijo en todo igualas!
Quien mortal hace al inmortal abuelo,
Y al padre mortal da inmortal salas ?


oooooooooooooooooooooooooooooo

Si el fuego que me enciende, consumido
De algún mas suelto Aquario ser pudiese;
Si el alto suspirar me convertiese
En aire, por el aire desparecido;

Si un horrible rumor siendo sentido,
La alma á dejar el cuerpo redujese;
O por estos mis ojos al mar fuese
Este mi cuerpo en llanto convertido;

Nunca podería la fortuna airada,
Con todos sus horrores, sus espantos,
Derrocar la alma mía de su gloria.

Porque en vuestra beldad ya transformada,
Ni del Estigio lago eternos llantos
Os podrian quitar de mi memoria.

P.S.    Espaço dedicado ao meu poeta, ... Luis Vaz de Camões.

05 março 2010

Cinzas.

Debaixo
do desdém das palavras que te digo
anda um capacho
com os olhos de um mendigo.
Por fora, este orgulho
de gelar espadas ...
Mas quando em mim mergulho,
são cinzas ajoelhadas.

04 março 2010

Vergonha.

(Peñíscola - España)
Depois do saque
violaram a jovem da sombra nua !
Ah!!! tenho vergonha do sol e até da lua.
Vergonha das flores com sangue a chorar,
porque nem todo o orvalho cai do ar.
Vergonha da sombra a seguir-me pelo chão,
de rastos, como um bicho de solidão ...
Vergonha das pedras que piso,
dos olhos das crianças cheias de riso,
dos soluços das mães,
e do uivo dos cães
na noite medonha
do assassinato
à luz dos archotes
- com a sombra a tremer de medo
no muro do vento.
Mas o pior é que o homem
tanto sujou a morte,
que até tenho vergonha
de morrer ...
(Peñíscola - España)

03 março 2010

Páginas desfolhadas.

(Oropesa del Mar)
O sol nasceu como de costume
e morreu à hora certa ...
De novo este anseio
de transformar um dia inútil e próprio
no amanhã de toda a gente.
Apenas um frio entre dois sonos
em que mais uma vez tentei em vão
fixar a realidade
neste mundo de pedras e nuvens
- onde a vida se esvai
na eternidade breve
do avesso das noites.
(Oropesa del Mar)